Localizada em Xabregas, na zona oriental da cidade de Lisboa, a Igreja
da Madre de Deus integrava o convento com o mesmo nome, fundado no
início do século XVI, parte do qual é ocupado pelo Museu Nacional do
Azulejo. O edifício resulta de sucessivas campanhas de obras, que
alteraram a configuração original de cariz manuelino.
A igreja
desenvolve-se numa planta irregular, composta pela nave retangular e
pela capela-mor quadrada, que se ajusta com o volume da sacristia,
construído no ângulo esquerdo superior e formando um L invertido. A
fachada principal, erigida no pano lateral do templo (como era comum nas
igrejas conventuais femininas), apresenta-se dividida em três tramos,
marcados por contrafortes e rasgados a espaços regulares por janelas,
trilobadas com cogulhos no registo inferior, retangulares com colunelos
laterais no superior. No pano central destaca-se o monumental portal
manuelino em arco trilobado, precedido por escadaria e delimitado por
dois botaréus, que no intradorso exibe um friso escultórico de motivos
vegetalistas, e no extradorso é envolvido por cogulhos enquadrando o
escudo de Portugal, ladeado no exterior pelas armas da rainha D. Leonor e
de D. João II. O frontispício é rematado a toda a volta por platibanda
neo-manuelina com elementos alusivos à fundadora do cenóbio. Ainda no
exterior, junto à zona do coro-alto, foi erguida a torre sineira, de
três registos, com porta em arco apontado com cogulhos, assente sobre
colunelos.
O claustro maneirista, adossado à fachada posterior do templo, divide-se em dois andares, apresentando um chafariz ao centro.
O interior da igreja anuncia um programa decorativo de gosto barroco, com teto de caixotões pintado com cenas da Vida da Virgem, executado entre 1670 e 1690 pela oficina de Marcos da Cruz e Bento Coelho da Silveira, painéis azulejares com temas do Velho Testamento, cenas de paisagem e temática franciscana, provenientes da Holanda e colocados em 1686, talha joanina revestindo o coro-alto e o arco cruzeiro, um púlpito em talha rococó e pinturas da autoria de André Gonçalves, colocadas na sacristia e no ante-coro.
O Convento da Madre de Deus, ou
Real Mosteiro de Enxobregas, foi fundado em 1509 por iniciativa da
rainha D. Leonor, mulher de D. João II, estando a igreja primitiva
concluída antes de 1522, data em que era representada no Retábulo de
Santa Auta (hoje no Museu de Arte Antiga). O templo manuelino teve um
erudito programa decorativo, do qual subsistem, para além deste
retábulo, pinturas de Quentin Metsys ou composições cerâmicas da oficina
dos Della Robia.
Como qualquer casa monástica, a Madre de Deus
passou por diversas campanhas que visaram ampliar e redecorar o espaço
sacro. Cerca de 1550 D. João III entregou ao arquiteto Diogo de Torralva
a reforma do cenóbio, numa obra que se arrastou até finais do século
XVI e de que subsiste o claustro. Com o reinado de D. Pedro II e a
recuperação da crise pós-Restauração, o convento recebeu novas obras,
sobretudo de ornamentação da igreja; a reforma prosseguiu com D. João V,
datando deste reinado a talha e o ciclo pictórico da autoria de André
Gonçalves. O terramoto de 1755 destruiu parte da estrutura do templo,
que rapidamente foi reconstruído.
Com a extinção das Ordens
religiosas, o património móvel da Madre de Deus foi disperso entre as
coleções régias e o que viria a ser o Museu Nacional de Arte Antiga. A
igreja encerrou ao culto em 1868 e o espaço do convento destinou-se a
asilo, com a premissa de transformar o templo e as suas dependências num
museu.
Porém, só na segunda metade do século XX este projeto seria
concretizado; entre 1957 e 1958, com o apoio da Fundação Gulbenkian,
foram realizadas as primeiras obras de cariz museológico, por ocasião do
V Centenário do Nascimento da Rainha D. Leonor, e em 1965 era
finalmente fundado o Museu do Azulejo, sendo nomeado João Miguel dos
Santos Simões como seu primeiro diretor.
DGPC, 2017
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