Ao fixar o reflexo dos meus olhos no espelho, já me pareceu muitas vezes que está outra pessoa dentro deles. Observa-me, julga-me, mas não tem voz para se exprimir. Será talvez eu com outra idade, criança ou velho: inocente, magoado por me ver a destruir todos os seus sonhos; ou amargo, a culpar-me pela construção lenta dos seus ressentimentos. Seria melhor se tivesse palavras para dizer-me, mas não. Só aquele olhar lhe pertence. É lá que está prisioneiro.
PEIXOTO, José Luís, O Livro, Lisboa, Quetzal. p. 250.
2 comentários:
Excelente passagem.
Olá Hortense. Vim aqui dar uma olhada e fiquei agradavelmente surpreendido com os excertos dos livros que vais lendo: espelham bem o que o livro é. Neste caso em concreto, o "Livro" do Peixoto, é uma obra que vale, essencialmente, pela beleza de certas passagens em prol do conjunto. Tive oportunidade de falar com o autor na apresentação do seu livro e a sua opinião em relação ao mesmo vai muito nesse sentido. Ainda assim, creio ser esta a obra de Peixoto com maiores pretensões a obra de escritor, com "e" grande.
Continua, beijos.
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