Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
A quem Neptuno e Marte obedeceram.
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
Que outro valor mais alto se alevanta.
E vós, ó bem nascida segurança
Da Lusitana antiga liberdade,
E não menos certíssima esperança
De aumento da pequena Cristandade;
Vós, ó novo temor da Maura lança,
Maravilha fatal da nossa idade,
Dada ao mundo por Deus, que todo o mande,
Para do mundo a Deus dar parte grande;
Por este vos darei u Nuno fero,
Que fez ao Rei e ao Reino tal serviço,
Um Egas e um Dom Fuas, que de Homero
A cítara para eles só cobiço.
Pois pelos Doze de Pares dar-vos quero
Os Doze de Inglaterra e o seu Magriço.
Dou-vos também aquele ilustre Gama
Que para si de Eneias toma a fama.
Mas enquanto este tempo passa lento
De regerdes os povos, que o desejam,
Dai vós favor ao novo atrevimento,
Para que estes meus versos vossos sejam;
E vereis ir cortando o salso argento
Os vossos Argonautas, por que vejam
Que são vistos de vós no mar irado,
E costumai-vos já a ser invocado.
Já no largo Oceano navegavam,
As inquietas ondas apartando;
Os ventos brandamente respiravam,
Das naus as velas côncavas inchando;
Da branca escuma os mares se mostravam
Cobertos, onde as proas vão cortando
As marítimas águas consagradas,
Que do gado de Próteu são cortadas,
Qual Austro fero ou Bóreas, na espessura
De silvestre arvoredo abastecida,
Rompendo os ramos vão da mata escura,
Com ímpeto e braveza desmedida;
Brama toda montanha, o som murmura,
Rompem-se as folhas, ferve a serra erguida:
Tal andava o tumulto, levantados
Entre os Deuses, no Olimpo consagrado.
Comendo alegremente, perguntavam,
Pela Arábica língua, donde vinham,
Quem eram, de que terra, que buscavam,
Ou que partes do mar corrido tinham?
Os fortes Lusitanos lhe tornavam
As discretas respostas que convinham:
Os Portugueses somos do Ocidente,
Imos buscando as terras do Oriente.
O recado que trazem é de amigos,
Mas debaixo o veneno vem coberto,
Que os pensamentos eram de inimigos,
Segundo foi o engano descoberto.
Oh! Grandes e gravíssimos perigos,
Oh! Caminho de vida nunca certo,
Que aonde a gente põe sua esperança
Tenha a vida tão pouca segurança!
No mar tanta tormenta e tanto dano,
Tantas vezes a morte apercebida;
Na terra tanta guerra, tanto engano,
Tanta necessidade aborrecida!
Onde pode acolher-se um fraco humano,
Onde terá segura a curta vida,
Que não se arme e se indigne o Céu sereno
Contra um bicho da terra tão pequeno?
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