terça-feira, 2 de junho de 2020

Quando quis...



Quando quis ser fruto
Fui fome,
Não mais do que areia
De um chão sem cio.

Quando sonhei ser pano
Fui agulha.
E morri no sono do gesto
De enrolar o fio.

Quando aprendi a ser poente
Já não havia céu.

Quando quis anoitecer
Tudo era luz.

E assim me condeno
Em livre vício:
No mais derradeiro
Eu só vislumbro um início.

 COUTO, Mia, Tardio, Idades cidades divindades – Poesia, 3.ª edição, Alfragide, Caminho, 2016, p.34

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