domingo, 13 de outubro de 2024

O filho mais novo

O filho mais novo pode resultar num brinquedo de pentear, um enfeite de pensamentos ocasionais, dotado de algum vocabulário para responder a comandos de organização e afectivos. Enfeitado com um sorriso, eu ficava a mando. Ao contrário de se abrir o caminho pelos irmãos mais velhos, em muitas ocasiões somos empecilhados, e são mascaradas todas as verdades para que conservemos a encantadora ingenuidade que nos faz pensar que o mundo é belo. Era mais apetecível à economia familiar que eu persistisse aquela criatura doméstica, feito de abracinhos e temor, muita paciência e voz baixa, com meus desenhos e caderninhos, a gastar o tempo em toda a lentidão possível. Eu não era necessário para adulto. Teria de ser a criança mais longeva de todas.

MÃE, Valter Hugo, Contra mim, Porto, Porto Editora, 2020 p. 109.





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