quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024

Larga venta

Bojudo fradalhão de larga venta,

Abismo imundo de tabaco esturro,

Doutor na asneira, na ciência burro,

Com barba hirsuta, que no peito assenta;


No púlpito um domingo se apresenta;

Prega nas grades espantoso murro;

E acalmando do povo o grão sussurro

O dique das asneiras arrebenta.


Quatro putas mofavam de seus brados,

Não querendo que gritasse contra as modas

Um  pecador dos mais desaforados;


"Não (diz uma) tu padre não me engodas;

Sempre me há de lembrar por meus pecados

A noite em que me deste nove fodas!" 



BOCAGE - sonetos completos de Bocage, Lisboa, Círculo de Leitores, 1983, p. 200.

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Tardoz


(a beleza é sempre exterior, mesmo num quadro...)

Igreja de São Francisco de Évora

Vou aguardar por demasiados amanheceres ?...

Sinto-me a envelhecer 

E a beleza a desvanecer

Por oportunidades perder

Com o silêncio a crescer

Nunca pensei um início tão em modo de retroceder...

A média cada vez a reduzir

Poucos abraços e parcas palavras

a minha meiguice sem perceber 

a minha inexperiência a questionar se este é um castigo que devo merecer

Foguetão a perder

De que serve a liberdade se não gozo poder

Para quê que eu fui florescer??

Surgem dúvidas difíceis de combater 

Espero visita para te surpreender 

Anseio por aquecer

Escrever e escrever

A tua existência vou esquecer?

Bem sei que há mais para entreter


Vou aguardar por demasiados amanheceres ?...


XPTO

Castelo de Useldange












 

Luar de Janeiro




 ÉVORA

Namorar

Namorar, para não sentir só 

Para não me irritar em ver amar

Será pedir muito um beijo ou um abraço 

Alguém para me apoiar

Simplesmente desabafar

No hospital senti falta...

Um homem em se preocupar

Simplesmente estar

Ir-me buscar num dia de chuva

Procurar-me pelo que sou

Desejar-me quando estou

Eu amadureci

Já não acredito no príncipe encantado

Mas sei que por aí há uma alma gémea 

Entretido em alguém 

Ou disfarçado 

Não o encontro na na minha rotina

Desisti de procurar na josefina

E assim vivo

Ou sobrevivo

Conforme o clima

Odiando o que não devia 

Apenas por ver

Que não sei 

Nem nunca saberei o que é 

Esse universo que é o amor

Porque aos meus olhos ninguém me encanta

Será que sou assim alguém que só de ver espanta???

Procurei ser emancipada 

Mas não deixo esta vida desmaiada

Demasiada exigência para mim

Ou reduzida migalha

Não percebo muito desta vida

Mas não percebo o porquê deste número

uma animação ao contrário 

adoração nem que estivesse na testa

provavelmente, iria receber na mesma moeda...

Amizade nunca será o mesmo que esse verbo que move montanhas

Deus mostre-me o caminho

Que eu descubra o mimo

Não me iludi

Muito descobri

Mas muito mais esperei

Amor sei

Que nem eu e tu o senti

Aprendi

A fase intermediária

Isso não me deixa irritada

Apenas frustrada

diminuta visita

sei que isso obriga-me a procurar o amor

Procuro chegar à meta

Amar e ser amada

Não parece tão complicado 

Mas porque é que para mim está tão afastado?


XPTO

Gato atrelado





ÉVORA

uma solidão sombria, era insuportável

  FAULKNER, William, Mosquitos, Alfragide, Publicações D. Quixote, 2013, p. 25.

sábado, 24 de fevereiro de 2024

Estou de um lado / mas represento ambos os lados

Estou de um lado

mas represento ambos os lados

nesta guerra

não é por isso que estamos a perder

mas é por isso que a vitória é lenta

A paciência é a nossa arma,

a oração a nossa estratégia

e o sacrifício o nosso entendimento

destes tempos.

Ganha coragem, tu que

ainda não te juntaste,

procura o estandarte que

erguemos,

e vem ter connosco quando os muros

do teu santuário começarem a

ceder sobre o peso das lágrimas 


COHEN, Leonard, A Chama, Lisboa, Relógio d´Água, p. 253.

De convento a museu











Museu Carlos Machado

Ponta Delgada
 São Miguel