segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

Ruas da cidade

Rua da Oliveira, Évora 

Na noite calada e quieta como um grande segredo,

andando ao deus-dará nestas ruas desertas,

saio lá do fundo do meu sonho

e olho ao redor de mim.


Cá fora há tudo o que não é do meu sonho:

o frio, e os altos prédios fechados,

e as ruas mortas como paisagens de cemitérios.

E a claridade fugidia dos candeeiros cansados,

como pálpebras que se vão fechar.

E o torpor saindo de todas as coisas

e pairando no ar, como um desmaio iminente...

Só eu tenho ainda passos para andar

e uma não sei que ternura

para todos que estão, para lá das paredes,

adormecidos e descuidados

à morte que espreita escondida no mistério [da noite...


 FONSECA, Manuel, Obra poética, Alfragide, Caminho 11.ª ed., 2011, p.103

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