sábado, 10 de junho de 2023

Na Praia da Rocha


Quando tudo é claro ao meu redor

como aquela luz (onde a vi?)

do princípio e do ardor do mundo

e estão presentes com seus aromas

a terra a mulher e o mar

e as garras  de seda do desejo

lembro-me António dos poemas

que nos leste ora ao sol ora

ao abrigo de uma rocha

ou animal mitológico

Sob o vasto céu do verão

ouvíamos-te Nem uma abelha

nenhum zumbido Mas se desse

espaço sagrado nos afastássemos

um metro o sol abraçava-nos e a labareda

ardia Havia ali perto uma bilha

com sangria que um turista

enterrara na areia Toda a orla

da praia devastada pela luz

O Casimiro foi buscar água

e eram à sua volta rochas de sol

e diamantes figuras pagãs

de um esquecido culto

Teu olhar sem fundo

sábio e triste por vezes exaltado

inquiria o lume daquela areia

sem fim como se pudesse nela achar

no seu absoluto silêncio

a unidade perdida

de todos os seres vivos e mortos

do tempo em rotação.


RODRIGUES, Urbano Tavares, Poesia - Horas de vidro, Alfragide, Publicações D. Quixote, 2010,  pp. 59-60.

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