terça-feira, 13 de julho de 2021

Entre os que vão para o mar

Praia do Amado, Portimão 

Entre os que vão para o mar há os que descobrem novos mundos e acrescentam continentes à terra e estrelas ao céu: são os mestres, os grandes, os eternamente magníficos. Depois há os que cospem terror das portinholas dos navios, que pilham, que ficam ricos e engordam. Outros vão à procura de ouro e de seda sob céus estranhos. Outros ainda apanham salmão para os gourmet ou bacalhau para os pobres. Eu sou o obscuro e paciente pescador de pérolas, que mergulha nas aguas mais profundas e sobe de mãos vazias e cara roxa. Uma atracção fatal puxa-me para os abismos do pensamento, para os recônditos mais inacessíveis que nunca param de fascinar os fortes. Vou passar a minha vida a a olhar para o oceano da arte, onde outros viajam ou lutam; e de tempos a tempos vou-me entreter a mergulhar para apanhar aquelas conchas verdes e amarelas que ninguém vai querer. Vou ficar com elas para mim e cobrir com elas as paredes da minha cabana.

 

BARNES, Julian, 1846O papagaio de Flaubert, Lisboa, Quetzal, 2019, pp. 40-41

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