terça-feira, 30 de novembro de 2021
Tudo é efémero
Tudo é efémero:
ontem escutava a tua voz
hoje só o vento
MENDONÇA, José Tolentino, Papoila e o monge, Assírio e Alvim, 2019
segunda-feira, 29 de novembro de 2021
O pouco que sei
Sei que o amor, essa missão selvagem,
dedicada, impossível, é a única forma
de estar neste mundo sem errar.
PIQUERAS, Juan Vicente, Instruções para atravessar o deserto - poemas escolhidos, Porto, Assírio & Alvim, 2019, p. 133.
Silêncio
O silêncio não é um modo
de repouso ou suspensão
mas de resistência
MENDONÇA, José Tolentino, Papoila e o monge, Assírio e Alvim, 2019, p. 22.
domingo, 28 de novembro de 2021
O que é?...
O que é o nervoso?
É a lamparina de aço.
O que é a paciência?
É um alicate em dia de trovoada.
Que és tu?
Um fio que ato à volta da cabeça.
CESARINY, Mário,- O lorinhão escorreito, Primavera autónoma das estradas, Assírio & Alvim, 2.a edição, 2017, p 90.
sábado, 27 de novembro de 2021
O mito do eterno retorno
O mito do eterno retorno diz-nos, pela negativa, que esta vida, que há de desaparecer de uma vez por todas para nunca mais voltar, é semelhante a uma sombra, é desprovida de peso, que, de hoje em diante e para todo o sempre, se encontra morta e que, por muito atroz, por muito bela, por muito esplêndida que seja, essa beleza, esse horror, esse esplendor não têm qualquer sentido.
sexta-feira, 26 de novembro de 2021
A aranha
"A aranha constrói a sua teia
durante a noite. Escolhe um canto
sossegado, onde as vassouras
não cheguem, e não pensa em dormir.
De manhã, quando as janelas
se abrem e o sol entra na casa,
os seus raios atravessam a teia
e são capturados por ela.
E a aranha ri-se, ao ver
o sol preso nos fios
que teceu."
JÚDICE, Nuno, Regresso a um cenário campestre, Lisboa, D. Quixote, 2020, p. 24.
quinta-feira, 25 de novembro de 2021
coisas que não deixam rasto
Coisas que não deixam rasto:
o relâmpago na noite
o voo das garças contra a neve
MENDONÇA, José Tolentino, Papoila e o monge, Assírio e Alvim, 2019, p 104.
Faro
quarta-feira, 24 de novembro de 2021
PROMESSA
És tu a Primavera que eu esperava,
A vida multiplicada e brilhante,
Em que é pleno e perfeito cada instante.
ANDRESEN, Sophia de Mello Breyner, Obra do mar, Caminho, 5.ª edição, 2005, p. 21.
Reconheci-te
Reconheci-te logo destruída
Sem te poder olhar porque tu eras
O próprio coração da minha vida
E eu esperei-te em todas as esperas.
Conheci-te e vivi-te em cada deus
E do teu peso em mim é que eu fui triste
Sempre. Tu depois só me destruíste
Com os teus passos mais reais que os meus.
Porquê P?
ANDRESEN, Sophia
de Mello Breyner, Obra do mar, Caminho, 5.ª edição, 2005, p. 62.
Se eu fosse a ti
Se eu fosse a ti amava-me, telefonava,
não perdia tempo, dizia-me que sim.
Não hesitava mais, fugia.
Dava o que tens, o que tenho,
para ter o que dás, o que me darias.
Soltava o cabelo, chorava
de prazer, cantava descalça, dançava,
punha em fevereiro um sol de agosto,
morria de prazer, não punha
nenhum mas a este amor, inventava
nomes e verbos novos, estremecia
de medo perante a dúvida de que fosse
só um sonho, fugia
para sempre de ti, de ali, comigo.
Se eu fosse a ti amava-me.
Dizia-me que sim, vinha
a correr para os meus braços,
ou pelo menos, sei lá, respondia
às minhas mensagens, às minhas tentativas
de saber que é feito de ti, telefonava-me,
que será de nós, dava-me
um sinal de vida, se eu fosse a ti. P
PIQUERAS, Juan Vicente, Instruções para atravessar o deserto - poemas escolhidos, Porto, Assírio & Alvim, 2019, p. 101
Atei os sentidos à escuridão P
Atei os sentidos à escuridão
parado diante da tua porta
já não pergunto
MENDONÇA, José Tolentino, Papoila e o monge, Assírio e Alvim, 2019, p. 44.
terça-feira, 23 de novembro de 2021
Liberdade na leitura
Mas a liberdade mesmo chegou ontem, sábia e cálida como as avós, cheirando a sândalo, cheia de títulos baptismais, de segredos milenares e de mistérios infinitos: os nossos livros. (…) Ler é silenciar o que não deve ser ouvido. Ler é calar o ruído do silêncio, esse que ensurdece. Ler é habitar o dia seguinte esculpido na nossa mente. Ler é o início do enigma. Ler é tirar e pôr em simultâneo. Ler é esvaziar o perpetuamente cheio. Estamos em plenitude. Voltar a ver, ou a ler, ou a ter um livro entre as mãos é dos mais belos reencontros que o ser humano pode vivenciar, seja na liberdade, seja no cativeiro. Para os livros não há cativeiro. Mesmo fechado, é sempre um mundo de braços abertos.
SOUSA, Lúcio Sousa, O Diabo foi meu padeiro, Alfragide, D. Quixote, 2019, p. 104.
Igrejas de Faro
As flores
Era preciso agradecer às flores
Terem guardado em si,
Límpida e pura,
Aquela promessa antiga
De uma manhã futura.
ANDRESEN, Sophia de Mello Breyner, No tempo dividido, Assírio & Alvim, 5.ª edição, 2019, p. 51
segunda-feira, 22 de novembro de 2021
domingo, 21 de novembro de 2021
sábado, 20 de novembro de 2021
sexta-feira, 19 de novembro de 2021
Devagar
Devagar no jardim a noite poisa
E o bailado dos seus passos
Liberta a minha alma dos seus laços,
Como se de novo fosse criada cada coisa.
ANDRESEN, Sophia de Mello Breyner, Obra do mar, Caminho, 5.ª edição, 2005, p. 72
Sozinha penso em ti, homem!
Mas não sabes as horas de delírio
Em que somente vivo de te ver;
E como choro e sofro noite e dia,
Quando sozinho penso em ti, mulher!
VERDE, Cesário, Cânticos do Realismo e outros poemas – 32 cartas, Lisboa, Círculo de Leitores, 2005, p. 55.