Não poder viajar pra o passado, para aquela casa e aquela afeição,
E ficar lá sempre, sempre criança e sempre contente!
Mas tudo nisto foi o Passado, lanterna a uma esquina de rua velha.
Pensar nisto faz frio, faz fone duma coisa que se não pode obter.
Dá-me não sei que remorso absurdo pensar nisto.
Oh turbilhão lento de sensações desencontradas!
Vertigem ténue de confusas coisas na alma!
Fúrias partidas, ternuras como carrinhos de linha com que as crianças brincam,
Grandes desabamentos de imaginação sobre os olhos dos sentidos,
Lágrimas, lágrimas inúteis,
Leves brisas de contradição roçando pela
a face a alma...
Evoco, por um esforço voluntário, para sair desta emoção,
Evoco, com um esforço desesperado, seco, nulo...
Álvaro de Campos
PESSOA, Fernando, Tenho medo de partir - um livro de viagens, Lisboa, Guerra e Paz, 2018, p.74.
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