quarta-feira, 13 de abril de 2022

Sobre flancos e barcos


Marina de Portimão


Havia ainda outro jardim o da minha vida

exíguo é certo mas o do meu olhar

são talvez dois pássaros que se amam

um sobre o outro ou dois cães não sei

é sempre a mesma inquietação


este delírio branco ou o rumor

da chuva sobre flancos e barcos

o inverno vai chegar

na palha ainda quente a mão

uma douçura de abelha muito jovem


era o sopro distante das manhãs sobre o mar

e eu disse sentindo os seus passos nos pátios do coração

é o silêncio é por fim o silêncio

vai desabar.


ANDRADE, Eugénio de, Véspera da água, Porto, Assírio e Alvim, 2014, p. 78.

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