quarta-feira, 22 de junho de 2022

Constelações do Verão

 Um corpo

estendido

        nu

na iminência de ser música


diz o que penso.


O fogo

súbita convulsão da água

sobe

pelas pernas

penetra nos lábios


vacilantes do verão


exausto

 e branco

porque entardecia.


O olhar 

    cai

errante

    cão


lambendo

a chama oscilante dos dedos


escassa língua

sobre flancos desertos.


As palavras

tão leves qu nem o ar feriam

nem sequer o ar


as palavras

que se levanta para recusar

(quando aprenderão a morder?)

são a nossa herança.


E o fogo.


 ANDRADE, Eugénio de, Véspera da água, Porto, Assírio e Alvim, 2014, pp. 71-72

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