sábado, 18 de junho de 2022

Elegia à moda antiga

 Nem tão tarde que me farte

nem que me raive de cedo

quando o mundo não tiver

nada mais por descobrir


Quando o amor se acabar

morra com ele o desejo

de ficar a ver as sobras

os restos da vida cheia


parado à beira do rio

onde as águas não descansam

no outro lado milagres

e margens verdes eternas


Enterro os dedos no lodo

quatrocentas gerações

um grande sonho pairando

enquanto o céu se carrega


Ai o destino dos homens

Ai o destino de mim

Corta-se a voz ao prinípio

Tranca o soluço no fim



SARAMAGO, José, Provavelmente alegria, Lisboa, Porto Editora, 2014, p. 62

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