sexta-feira, 24 de junho de 2022

O que amei de verdade nunca acordou comigo

Mãe, eu quero ir-me embora - a vida não é nada

daquilo que disseste quando os meus seios começaram

a crescer. O amor foi tão parco, a solidão tão grande,

murcharam tão depressa as rosas que me deram -

se é que me deram flores, já não tenho a certeza, mas tu

deves lembrar-te porque disseste que isso ia acontecer.


Mãe, eu quero ir-me embora - os meus sonhos estão

cheios de pedras e de terra; e quando fecho os olhos,

só vejo uns olhos parados no meu rosto e nada mais

que a escuridão por cima . Ainda por cima, matei todos

os sonhos quer tiveste para mim - tenho a casa vazia, 

deitei-me com mais homens do que aqueles que amei

e o que amei de verdade nunca acordou comigo.


PEDREIRA, Maria do Rosário, Poesia reunida, Lisboa, Quetzal, 2012, p.111

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