Para Sabina, viver significa ver. A visão encontra-se limitada por duas fronteiras: uma luz de tal modo intensa que nos cega e uma obscuridade total. Talvez seja daí que lhe vem a repugnância por todos os extremismos. Os extremos marcam a fronteira para lá da qual não há vida, e, tanto em arte como em política, a paixão do extremismo é um desejo de morte disfarçado.
Para Franz, a palavra luz não evoca a imagem de uma paisagem suavemente iluminada pelo sol, mas a fonte da luz enquanto tal: uma lâmpada, um projector. Vêm-lhe à cabeça as metáforas habituais: o sol da verdade, o brilho da razão, etc.
É atraído pela luz como também o é pela obscuridade. Nos dias que correm, quem apaga a luz para fazer amor arrisca-se a cair no ridículo; como ele tem consciência disso, deixa sempre uma luzinha acesa por cima da cama. No entanto, no momento em que penetra em Sabina, fecha os olhos exige a obscuridade. A volúpia que o invade exige a obscuridade. Uma obscuridade pura, absoluta, sem imagens nem visões, uma obscuridade sem fim, sem fronteiras, uma obscuridade que é o infinito que cada um de nós tem em sim (sim, porque quem busca o infinito só tem de fechar os olhos!)
No momento em que sente a volúpia espalhar-se-lhe pelo corpo, Franz dissolve-se no infinito da sua obscuridade, ele próprio se transforma em infinito.
KUNDERA, Milan, A Insustentável leveza do ser, Alfragide, D. Quixote, 32.ª edição, 2015, p. 121.
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