sábado, 5 de fevereiro de 2022

Erodido


N. Sra da Pobreza, Núcleo Museológico da Igreja de São Francisco de  ÉVORA 


Uma mão de mármore, mas só os dedos,

sobre um ombro de mármore sem cabeça.

 

Um braço erodido que ninguém estende a ninguém.

 

Um cavalo sem patas.

Um cavaleiro que é só as suas coxas.

 

Dionísio em pedaços. Recomposto.

 

Um touro sem cornos a ser devorado

por um leão que não está,

só as suas garras.

 

Admiramos o desaparecido.

Talvez a nossa cultura nasça destas ausências,

do vazio, do que não há.

 

Também nós somos o que fica

de nós.

O que nos falta,

o vazio que cuida de nós.

 

PIQUERAS, Juan Vicente, Museu da Acrópole, Instruções para atravessar o deserto - poemas escolhidos, Porto, Assírio & Alvim, 2019, p 85.

 

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