Se eu rezasse, pediria compaixão
para os que não amam, para os que não sabem
para onde olhar quando estão sós e lhes falta
um rosto amado na memória, para os que
olham para uma flor e só pensam no dia em que
irá morrer. Talvez o amor não seja a única
salvação dos que precisam de tudo, nem
a cura para os males de quem não sabe
o que é o sonho. Porém, sem ele, as suas mãos
serão ainda mais vazias, e as suas noites
não terão o horizonte de uma luz ao
amanhecer. Penso em todos eles, por
quem rezaria, se eu rezasse, e é o teu rosto
que eu vejo à minha frente, são as tuas mãos
que procuram as minhas, e é a tua existência,
só pelo facto de existires, que acende
na minha noite cada futura manhã. E rezo,
afinal, no fim de tudo, rezo para que a tua voz
não me falte, o teu corpo se vista com o perfume
do campo e por ti corra, sempre, o rio deste amor.
P
JÚDICE, Nuno, Regresso a um
cenário campestre, Lisboa, D. Quixote, 2020, p. 29.
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