sábado, 14 de maio de 2022

A mim me traíste com esperanças enganosas.

Considera, ó Amor que tenho em mim, até que ponto foste imprevidente. Ai, infeliz! Foste traído, e a mim me traíste com esperanças enganosas.

Uma paixão acerca da qual tantos projectos de prazeres arquitecturaras apenas te provoca no presente um mortal desepero, que só à crueldade da ausência que lhe dá causa se pode comparar. Irá então esta ausência, à qual  minha dor, engenhosa como é, não pode dar nome suficientemente funesto, privar-me para sempre de contemplar aqueles olhos onde via tanto amor, e que ma faziam conhecer sentimentos que me cumulavam de alegria, que substituíam todas as coisas e que afinal me bastavam? Ai de mim, que tenho olhos ora privados da única luz que os animava: nada lhes resta além de lágrimas e nenhum uso lhes dei que não fosse chorar constantemente desde que soube que estáveis enfim decidido a um afastamento que me é insuportável e que em pouco tempo me fará morrer.


 Cartas portuguesas de Mariana Alcoforado, Lisboa, Terreiro do Paço Editores, 2013, pp. 27-28.

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