terça-feira, 31 de agosto de 2010

A província



A província, senhores, deixai-me contar: todas as suas violências do lugar-comum, todas as sevícias do sentimento que se não espelha nos interesses têm aí o seu reinado. Se sois altruísta, magnâmino, desafectado de ambições, pródigo de certas profecias do coração, não demoreis os vossos passos nessas belas vilas tão inofensivas para o forasteiro e tão inquietantes para o que projecta mudança. Na província, o costume é o soberano. Pensai alterá-lo, e tereis arcontes e beleguins, trovadores e donas contra a vossa vida.
Proclamai uma inovação, e cozinheiras honestas, magas do bolinho de bacalhau e da lampreia bordalesa, hão de ministrar-vos uma mistura ervada. A paz da província chama-se prudência. Uma prudência ataviada de simpatias e consentimentos, às vezes uma prudência chamada instinto clerical, botâncio, que destila veneno e doçura da mesma planta. Se quereis viver seguro, não useis dos vossos demónios na província, ou o vosso fígado será devorado.
LUÍS, Agustina Bessa, A Brusca, Lisboa, Editorial Verbo, p.p. 10-11.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Raio de sol



Nada me alegra mais que um raio de sol, sobretudo se dá na verdura da
folhagem de uma árvore, e o raio de sol não está alegre nem triste, e quem
sabe... se calhar o seu próprio calor devora-o.... O raio de sol alegra porque
está limpo; tudo o que é limpo alegra...


UNAMUNO, Miguel de, A Tia Tula, Lisboa, Editorial Verbo, 1971 (?), p. 107

domingo, 29 de agosto de 2010

SOMBRA

No Verão é algo que procuramos para fugir ao calor. Afinal, um bom alentejano anda sempre à sombra dos 40 graus e muitos! Mas a sombra é algo que transcende a nós e nos aprisiona, quando caminhamos na rua...


Conforme nos apercebemos pela leitura de um conto de Lídia Jorge, que nos explicita tão bem algo tão natural a nós, mas por vezes tão ignorado devido à sua rápida metamorfose: ... de dia o sol continuava a cair a pino. Se uma pessoa saísse e atravessasse o largo ou qualquer rua, veria ainda a sua sombra agarrada ao corpo, cabeça pregada a uma mancha de rotação de pernas presas à volta da cintura. Pelo solo. Como anão. Um batráquio.

JORGE, Lídia, O dia dos prodígios, Lisboa, Publicações D. Quixote, 2010, p.p. 212-213.

sábado, 21 de agosto de 2010

Ponta do Altar


O céu, de um azul intensíssimo, está como que esponjado de pequenas nuvens; a Ponta do Altar perfila-se com o seu recorte siracusano, e pouco a pouco, ao declinar do sol, acende-se em oiro.


GOMES, Manuel Teixeira, Vénus momentânea, O sítio da Mulher Morta, s.l., Editorial Verbo, 1972, p. 31.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Abençoado Algarve


(...) abençoado trecho da costa do Algarve, tantas vezes por mim encarecido, que abre da Ponta do Altar à Ponta da Piedade, isto é, da sucessão de praias de areia finíssima e doirada, fechadas e semeadas de rochedos multicores, que se vão lentamente esboroando, e afeiçoando em composições pitorescas, onde parece que entrou a mão de algum artista ao mesmo tempo delicado e poderoso.



GOMES, Manuel Teixeira, Uma cena grega, O Sítio da Mulher Morta, s.l., Editoral Verbo, p. 43.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Viajar

Para que o meu blogue não seja só de imagens de viagens que faço, decidi publicar alguns excertos das minhas leituras de Verão de autores portugueses, por também este ano me ter virado para a literatura. E começo esta nova perspectiva com uma citação de uma escritora algarvia sobre as vantagens de viajar, algo que todos gostamos de fazer:
quem uma vez não saiu de Vilamaninhos não conheceu nem conhecerá a realidade da terra. É preciso cavalgá-la devagar, ver e descer montes e baixuras para se entender que a viagem abre um véu, e fecha outro véu, atrás, atrás da vista. Atrás da cauda da mula.
JORGE, Lídia, O dia dos prodígios, Lisboa, Publicações D. Quixote, 2010, p. 34

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Palácio Bivar


Construído na última década do séc. XVIII, no "sapal" de Portimão, este edifício, do estilo neoclássico pertenceu à família Bivar até ter se tornar na actual sede da Câmara Municipal.