domingo, 6 de março de 2016

Rio turvo

O luar entrava pela janela e fazia no chão um quadrado branco, espalhando pelo aposento a sua claridade vaga que me excitava ainda mais a imaginação. Ouvia lá fora as corujas à caça, que poisavam nas árvores e piavam. Era uma vida intensa na sua plenitude a expandir-se, desde as rãs aos ralos, às águas do rio que por vezes parecia ouvir também, como se a torrente tivesse crescido e inundado as margens, uma vida latente e realizada em tudo. Só eu ali deitado a negar-me o caminho verdadeiro. Nunca fui para limites nem renúnicas. E o rio turvo crescia, crescia sempre, passava sobre o mundo e levava tudo... Até que adormeci, de cansado.

FONSECA, Branquinho da, Rio Turvo, Lisboa, Editorial Verbo, s.d.,  p. 49.

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