No século treze, havia os comerciantes, os padres e os soldados. No século
vinte, já não há senão os comerciantes. Estão nas suas lojas, como padres nas
suas igrejas. Estão nas suas fábricas, como soldados nos seus quartéis.
Espalham-se pelo mundo, graças ao poder das suas imagens. Encontrámo-los sobre
os muros, nos ecrãs, nos jornais. A imagem é o seu incenso, a sua espada. O
século treze falava ao coração. Não tinha necessidade de falar alto, para se
fazer ouvir. Os cantos da Idade Média fazem pouco mais ruído do que a neve a
cair sobre a neve. O século vinte fala aos olhos e, como a vista é um dos
sentidos mais volúveis, é preciso berrar-lhe, gritar com luzes violentas, cores
ensurdecedoras, imagens desesperantes, à força de serem alegres, imagens
porcas, à força de serem asseadas, esvaziadas de toda e qualquer sombra e de
todo e qualquer desgoto. Imagens incoloravelmente alegres. É que o século vinte
fala para vender e, por conseguinte, precisa de lisonjear os olhos –
lisonjeá-los e cegá-los ao mesmo tempo. Deslumbrá-los. O século treze tem muito
menos para vender – Deus não tem preço, não tem mais valor comercial do que um
floco de neve que cai sobre os milhares de outros flocos de neve.
BOBIN, Christian,
Francisco e o Pequenino, Braga, Editorial A.O., 2013, p. 109.
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