quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Do século XIII ao XX




No século treze, havia os comerciantes, os padres e os soldados. No século vinte, já não há senão os comerciantes. Estão nas suas lojas, como padres nas suas igrejas. Estão nas suas fábricas, como soldados nos seus quartéis. Espalham-se pelo mundo, graças ao poder das suas imagens. Encontrámo-los sobre os muros, nos ecrãs, nos jornais. A imagem é o seu incenso, a sua espada. O século treze falava ao coração. Não tinha necessidade de falar alto, para se fazer ouvir. Os cantos da Idade Média fazem pouco mais ruído do que a neve a cair sobre a neve. O século vinte fala aos olhos e, como a vista é um dos sentidos mais volúveis, é preciso berrar-lhe, gritar com luzes violentas, cores ensurdecedoras, imagens desesperantes, à força de serem alegres, imagens porcas, à força de serem asseadas, esvaziadas de toda e qualquer sombra e de todo e qualquer desgoto. Imagens incoloravelmente alegres. É que o século vinte fala para vender e, por conseguinte, precisa de lisonjear os olhos – lisonjeá-los e cegá-los ao mesmo tempo. Deslumbrá-los. O século treze tem muito menos para vender – Deus não tem preço, não tem mais valor comercial do que um floco de neve que cai sobre os milhares de outros flocos de neve.
BOBIN, Christian, Francisco e o Pequenino, Braga, Editorial A.O., 2013, p. 109.

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