Lisboa é esta
praça com árvores e com pássaros
Merlos piscos
toutinegras rouxinóis
E barcos
inconcretos nos telhados onde
O azul do céu é
já um mar do avesso
Um reflexo do
Tejo ou talvez um
Pressentimento de
cadete ocaso Cabo Raso
Um navegar só
verbo em navio nenhum.
Lisboa é esta
janela de onde vejo
Tudo o que se não
vê que é o que há mais
Em Lisboa onde se
vê mesmo sem ver o Tejo
E onde cada
varanda é sempre um cais.
Lisboa é esta
praça e esta janela
Minha nau
capitânia sobre o insondável
Dentro de casa eu
vou de caravela
Bartolomeu Dias
neste mar inavegável
Não há Índia
perdida que não possa ser achada
Lisboa é esta
praça e esta viagem
Esta partida
mesmo se parada
Este embarcar no
azul até chegar àquela margem
Em cuja linha só
o abstracto pensamento passa
A margem única e
absoluta não mais que pura imagem
Sem precisar
sequer sair da Praça
João do Rio
número onze quarto direito
Onde eu Ulisses
vou à proa
Além de qualquer
cabo e qualquer estrito
Em Lisboa por
dentro de Lisboa.
ALEGRE, Manuel, Praça João do
Rio ou segundo poema do português errante,
Livro de português errante, Lisboa,
Publicações D. Quixote, 2001, pp. 39-40.
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