quinta-feira, 3 de julho de 2025

Um poema é o quê

Qualquer coisa de intermédio entre um antes

 de silêncio e um depois de silêncio.

Ou um rumor pesado de pedra. Deve ser.


Ou não.  Casulo intacto, pode existir 

Por si mesmo até ao fim. Cercado

Logo e sempre de silêncio, pois.

Só por momentos a lenta viagem 


Sonora a percorrer periferias da memória, 

Dos sentidos. Uno e concreto. Imóvel 

E puro. De carência e excesso. Precário 

Quão definitivo. Uma árvore 


Sem floresta, uma flor num jardim

Inexistente. Uma carta de pedra

Lançada ao mar. E quanto ao mais

Em poesia já tudo por Homero foi


Inventado. Cada poeta depois dele

Não fez mais que desinventar

O seu pedaço.

(...)


Branco,  Fernando de Castro in A mais frágil das moradas - poemas à memória de Eduardo Lourenço, Lisboa, Guerra e Paz Editores, 2023, p. 37.

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