terça-feira, 18 de janeiro de 2022

Maçã do mar

 Eu seria o homem e tu a mulher

vestida de tormenta.

Dormirias

no aconchego do mar menos pensado,

diadema de outra luz nos teus cabelos,

e nas mãos remotas

a areia fugitiva

de nós, desertos e felizes.

 

Viveríamos longe, esquecidos

do tempo, agora, em que éramos escravos

do nosso próprio medo e deste mundo,

sicário absurdo a soldo da morte.

 

A ilha está em nós

aguardando

que a raiva amadureça e nos rapte.

 

Eu seria o homem e tu a mulher.

 

A memória seria uma maçã.

 

PIQUERAS, Juan Vicente, Instruções para atravessar o deserto - poemas escolhidos, Porto, Assírio & Alvim, 2019, p. 23.

Sem comentários: