quinta-feira, 30 de junho de 2022
Não te prometo nada
Não te prometo nada
Frase que me fez cair,
derramou o meu sonho
desmoronou a minha montanha,
mais o desejo de te ter...
Nunca te pedi mais que um ano!
Relação sexual é,
quer ou não queiras relacionamento!
Não serás assim o meu biscoito...
Tanto que que te expliquei a minha maneira de ser
mas mesmo com tanto esforço não me vês,
só pensas na coleção que tens!
És indiferente à minha diferença...
Por ti estava disposta a tudo
mas essa frieza congelou-me
eu sei que para ti sou mais uma
mas recuso-me a ser uma qualquer!
Quero um doce,
não quero um P gelado,
não sou boneca insuflável
nem brinquedo de uma só noite,
sou gente
que deseja carinho...
Não terei A noite,
nem 365 noites,
sofrerei os meus dias de maneira igual...
Não quero casar contigo, porra!
Mas desejo abraços, beijos e carinho
Como posso confiar em ti?
Tanto que ansiei pelo fim das férias...
Preparei-me mentalmente
para o meu salto de gigante
e atingir o teu nível.
Ter de mentir por ti
Mantendo a discrição,
para não manchar respetiva reputação.
Mas com uma frase
estragaste tudo
Deste um pontapé no pé
melhor, na pila!
Tanto que queres foder
que te transformas em empata-fodas!
Eu não quero quando der!!!
Eu sou uma agulha no palheiro
como canta o Carlão
Não percebes isso?
(com tantas que conheceste não tiveste nenhuma como eu, de certeza...)
Não sabes lidar comigo
porque só tens tesão,
não tens compaixão!
Um ano de conversação
acaba em negação,
após tanta ilusão...
Eu não sou tua desconhecida!!
Confessei-te a minha alma
No entanto, tu achas todas iguais
Não arriscas nem em amantes,
nem em amizades coloridas,
só eróticas.
Não mais de três de seguida,
de certeza!
Cura os teus traumas
Ou procura as profissionais
Mas não desinquietes facebookianas
para as iludir, por favor!
Foste tu que me procuraste,
Despertaste-me
e ambicionava que me acordasses,
seguir em frente
e não pensar noutra gente
para estar contigo...
Só que quanto mais sonho,
mais me cortas as asas...
E eu vejo tristeza no meu olhar...
já não há aventura,
esperança
transe ou
encaixe
no campo, no carro ou na cidade...
Só este longo poema
sem fim, como o mar!
Adieux
meu diabinho
nuzinho
camarinho
XPTO ;(
Água azul
O reverso da carne, corpo ainda.
Como um punho fechado ou um bastão,
Abro o líquido azul, a espuma branca,
E por fundos de areia e madrepérola,
Desço o véu sobre os olhos assombrados.
(Na medida do gesto, a largueza do mar
E a concha do suspiro que se enrola.)
Vem a onda de longe, e foi um espasmo,
Vem o salto na pedra, outro grito:
Depois a água azul desvenda as milhas,
Enquanto um longo, e longo, e branco peixe
Desce ao fundo do mar onde nascem as ilhas.
SARAMAGO, José, Provavelmente alegria, Lisboa, Porto Editora, 2014, p. 82
terça-feira, 28 de junho de 2022
Feio fixar
Tudo, seja o Paraíso ou os rios do Éden
se torna feio quando nos fixamos permanentemente
num único pormenor.
RUMI, O Pequeno livro da vida - o jardim da alma, do coração e do espírito, Alma dos Livros, 2020, p. 49
segunda-feira, 27 de junho de 2022
domingo, 26 de junho de 2022
sábado, 25 de junho de 2022
Amor como em casa
Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa. Faço de conta que
não é nada comigo. Distraído percorro
o caminho familiar da saudade,
pequeninas coisas me prendem,
uma tarde num café, um livro. Devagar
te amo e às vezes depressa,
meu amor, e às vezes faço coisas que não devo,
regresso devagar a tua casa,
compro um livro, entro no
amor como em casa.
PINA, Manuel António, Todas as palavras - poesia reunida, Porto, Assírio e Alvim, 2012, p.36
Vamos ser velhos juntos nos degraus da casa P?
Vamos ser velhos ao sol nos degraus
da casa; abrir a porta empenada de
tantos invernos e ver o frio soçobrar
no carvão das ruas; espreitar a horta
que o vizinho anda a tricotar e o vento
lhe desmancha de pirraça; deixar a
chaleira negra em redor do fogão para
um chá que nunca sabemos quando
será - porque a vida dos velhos é curta;
mas imensa; dizer as mesmas coisas
muitas vezes por sermos velhos e por
serem verdade. Eu não quero ser velha
sozinha, mesmo ao sol, nem quero que
sejas velho com mais ninguém. Vamos
ser velhos juntos nos degraus da casa -
se a chaleira apitar, sossega, vou lá eu; não
atravesses a rua por uma sombra amiga,
trago-te o chá e um chapéu quando voltar.
PEDREIRA, Maria do Rosário, Poesia reunida, Lisboa, Quetzal, 2012, p. 244.
Se esperares demasiado dos seres humanos estás sujeita a ficar desiludida
SCHWARTZ, Delmore, Nos sonhos começam as responsabilidades, Lisboa, Guerra e Paz, 2020, p. 130.
sexta-feira, 24 de junho de 2022
Canção da vida
Clara uma canção
Rente à noite calada
Cismo sem atenção
Com a alma velada
A vida encontrei-a
Tão desencontrada
Embora a lua cheia
E a noite extasiada
A vida mostrou-se
Caminho de nada
Embora brilhasse
Lua sobre a estrada
Como se a beleza
Da lua ou do mar
Nada mais quisesse
Que o próprio brilhar
Por esta razão
Sem riso nem pranto
Neste sem sentido
Se rompe o
encanto. P
ANDRESEN, Sophia
de Mello Breyner, Ilhas, Assírio & Alvim, 6.ª edição, 2016, p. 42.
Quem pôs o luar no fundo dos teus olhos P?
E o luar na rua
e no teu rosto de menina deslumbrada.
Quem pôs o luar no fundo dos teus olhos?
Imóveis, no chão, e com uma vontade nem sei de [quê.
Decerto
foi numa noite dessas
que eu pus os dedos sobre o teu peito
e senti os teus seios nascerem debaixo das minhas [mãos!
(...)
FONSECA, Manuel, Quarto, Obra poética, Alfragide, Caminho 11.ª ed., 2011, pp. 88-89.
Criatura
Esplêndia criatura é a tua promessa de amor.
Não sei que lábios a pronunciaram nem que braços
se levantaram para a erguer no ar.
Mas é assim, a promessa entra pela casa
fala todas as línguas e é um homem.
Estranho que o seu rosto seja tão nítido
e no entanto não passe de um desenho
que se transformou na esplêndia criatura.
És feita de espera e não sabes pronunciar
outro verbo que não seja a conjugação
de amar. Que ridícula é essa designação aos
olhos dos móveis tranquilos que te vigiam.
Sorriem dessa tua ânsia por que surja a criatura
esplêndia. Quando virares as costas para a porta
verás que a tua casa abafa gargalhadas
mal contidas. Não sei de nada e espero tudo
- dizes. Nenhum riso te incomoda.
Esplêndia criatura.
JORGE, Lídia, O Livro das tréguas, Lisboa, D. Quixote, 2019, p. 37.
Chegaste tão depressa...
Vieste como um barco carregado de vento, abrindo
feridas de espuma pelas ondas. Chegaste tão depressa
que nem pude aguardar-te ou prevenir-me; e só ficaste
o tempo de iludires a arquitectura fria do estaleiro
onde hoje me sentei a perguntar como foi que partiste,
se partiste,
que dentro de mim se acanham as certezas e
tu vais sempre ardendo, embora como um lume
de cera, lento e brando, que já não derrama calor.
Tenho os olhos azuis de tanto os ter lançado ao mar
o dia inteiro, como os pescadores fazem com as redes;
e não existe no mundo cegueira pior do que a minha:
o fio do horizonte começou ainda agora a oscilar,
exausto de me ver entre as mulheres que se passeiam
no cais como se transportassem no corpo o vaivém
dos barcos. Dizem-me os seus passos
que vale a pena esperar, porque as ondas acabam
sempre por quebrar-se junto das margens. Mas eu sei
que o meu mar está cercado de litorais, que é tarde
para quase tudo. Por isso, vou para casa P
e aguardo os sonhos, pontuais como a noite.
PEDREIRA, Maria do Rosário, Poesia reunida, Lisboa, Quetzal, 2012, p.135
O que amei de verdade nunca acordou comigo
Mãe, eu quero ir-me embora - a vida não é nada
daquilo que disseste quando os meus seios começaram
a crescer. O amor foi tão parco, a solidão tão grande,
murcharam tão depressa as rosas que me deram -
se é que me deram flores, já não tenho a certeza, mas tu
deves lembrar-te porque disseste que isso ia acontecer.
Mãe, eu quero ir-me embora - os meus sonhos estão
cheios de pedras e de terra; e quando fecho os olhos,
só vejo uns olhos parados no meu rosto e nada mais
que a escuridão por cima . Ainda por cima, matei todos
os sonhos quer tiveste para mim - tenho a casa vazia,
deitei-me com mais homens do que aqueles que amei
e o que amei de verdade nunca acordou comigo.
PEDREIRA, Maria do Rosário, Poesia reunida, Lisboa, Quetzal, 2012, p.111
Sentaste-te num banco de jardim
Como todos acabamos, acabaste.
Mas não acabaste com quase todos acabamos.
sentaste-te num banco de jardim [P],
Separado pelo mar,
Separado de ti, separado de separações
Que te obrigassem a unir
Os ossos redimidos, os músculos mentais
Desse palácio de ideias, no dizer de Sérgio,
Que durante tanto tempo construíste
CARVALHO, Armando Silva, Anthero, areia e água, O País das minhas vísceras, s.l., Língua Morta, 2021, p. 388.
O decassílabo
o decassílabo menos ouvido
na quarta e sétima leva o acento:
possível é, todavia é fodido
em português ir-lhe dando andamento.
com solidão natural sentimento,
fica erodido, doído, delido:
entre silêncio e ruído é roído
e um solavanco lhe dá o sustento.
MOURA, Vasco Graça, Laocoonte, rimas váias, andamentos graves, Quetzal Editores, 2005, p.129.
quinta-feira, 23 de junho de 2022
O destino não está escrito nas estrelas e sim dentro de nós
William Shakespeare in HAY, Louise , HOLDEN, Robert, A vida ama-me, s.l., Pergaminho, 2015, p. 165
quarta-feira, 22 de junho de 2022
Constelações do Verão
Um corpo
estendido
nu
na iminência de ser música
diz o que penso.
O fogo
súbita convulsão da água
sobe
pelas pernas
penetra nos lábios
vacilantes do verão
exausto
e branco
porque entardecia.
O olhar
cai
errante
cão
lambendo
a chama oscilante dos dedos
escassa língua
sobre flancos desertos.
As palavras
tão leves qu nem o ar feriam
nem sequer o ar
as palavras
que se levanta para recusar
(quando aprenderão a morder?)
são a nossa herança.
E o fogo.
ANDRADE, Eugénio de, Véspera da água, Porto, Assírio e Alvim, 2014, pp. 71-72
terça-feira, 21 de junho de 2022
Princípio de Verão
Largos longos doces horizontes
A desdobrada luz ao fim da tarde
Um ar de praia nas ruas da cidade
Secreto sabor a rosa e nado arde.
ANDRESEN, Sophia de Mello Breyner, Ilhas, Assírio & Alvim, 6.ª edição, 2016, p. 68
domingo, 19 de junho de 2022
sábado, 18 de junho de 2022
O Transeunte
Todas as ruas que conheço
são um longo monólogo meu.
cheias de pessoas como árvores
batidas por obscuro ruído.
Ou se o sol floresce nas varandas
e semeia o seu calor na poeira agitada,
as pessoas que encontro são simples pedras
que não sei porquê vivem rodando.
Sob os seus olhos - que me fixam hostis
como se eu fosse inimigo de todos -
não consigo descobrir uma consciência livre,
de criminoso ou de artista,
mas sei que todos lutam sozinhos
pelo que procuram todos juntos.
São um longo gemido
todas as ruas que conheço.
Rogelio Echavarría in Um país que sonha - cem anos de poesia colombiana, Assírio e Alvim, s.l., 2012, p. 151.
Adorar/ é surpreender Deus/ na menor migalha
MENDONÇA. José Tolentino, Papoila e o monge, Assírio e Alvim, 2019, p 74
Elegia à moda antiga
Nem tão tarde que me farte
nem que me raive de cedo
quando o mundo não tiver
nada mais por descobrir
Quando o amor se acabar
morra com ele o desejo
de ficar a ver as sobras
os restos da vida cheia
parado à beira do rio
onde as águas não descansam
no outro lado milagres
e margens verdes eternas
Enterro os dedos no lodo
quatrocentas gerações
um grande sonho pairando
enquanto o céu se carrega
Ai o destino dos homens
Ai o destino de mim
Corta-se a voz ao prinípio
Tranca o soluço no fim
SARAMAGO, José, Provavelmente alegria, Lisboa, Porto Editora, 2014, p. 62
sexta-feira, 17 de junho de 2022
Coração, sê atencioso
alma, sê tolerante
paciência, foge se não consegues suportar o sofrimento
razão, vai e brinca aos teus jogos infantis.
RUMI, O Pequeno livro da vida - o jardim da alma, do coração e do espírito, Alma dos Livros, 2020, p.46
Nunca conseguirás conhecer o teu gato
quinta-feira, 16 de junho de 2022
ah, coração ingénuo
há uma melodia que habita rente às palavras e
sai do que as prende à morte. aterra é coruscante e melancólica
como a juventude doente. saber tudo isto em surdina,
numa espiral de saudades a que se deu ouvidos.
ah, coração ingénuo, coração aluado
nos bosques do entardecer, na terra de ninguém,
flutuas na agonia, ficaste um cão de rumos tristes,
um focinho de sangue aveludado no caderno
diário das paixões, quando a música exprime tão densos
remorsos vagabundos de viver assim
e tudo pode ser singelo, furtivo e lancinante
como uma oliveira a arder por dentro do seu silêncio.
MOURA, Vasco Graça, Laocoonte, rimas várias, andamentos graves, Quetzal Editores, 2005, p. 66.
O que é divertido no homem
terça-feira, 14 de junho de 2022
Carmim
Não te digo tanto quanto
quero
nem te faço tudo quanto sonho
Não me basto junto a ti
secreta
quando me entrego e a ti me oponho
Não te conto sequer
porque imagino
ser o desejo o carmim da boca
Morro de sede perto dos teus lábios
de ti quero ir bebendo
e ficar louca
HORTA, Maria Teresa, As palavras do corpo, Lisboa, 2.ª edição, Publicações D. Quixote, 2014, p. 253.
O meu coração é uma ostra
O meu coração é uma ostra
o rosto do meu Amado é a pérola.
Preencheu todo o espaço
e não reservou nenhum para mim
RUMI, O Pequeno livro da vida - o jardim da alma, do coração e do espírito, Alma dos Livros, 2020, p.64.
E se vier
E se vier que traga o coração
no seu lugar de paz. Amor diremos,
que outro nome melhor se não descobre.
Só a vida não diz quanto sabemos.
SARAMAGO, José, Provavelmente alegria, Lisboa, Porto Editora, 2014, p. 67.
Vai
Vai minha canção como um navio vai e leva-me
verso a verso desfolha-me
no coração de cada homem.
ALEGRE, Manuel, Praça da Canção,Lisboa, 5.ª edição, D, Quixote, 2015, p. 43.
segunda-feira, 13 de junho de 2022
O Amor
O Amor é o Leão da Verdade.
A desconfiança provoca a guerra
e a confiança restabelece a paz
mas o Amor ateia o fogo a ambos!
Só nas asas do Amor pode o coração voar
até à morada do amante.
RUMI, O Pequeno livro da vida - o jardim da alma, do coração e do espírito, Alma dos Livros, 2020, p. 59
Em conturbação os apaixonados
Certo é que não esmoreciam as asas que deixavam em conturbação os apaixonados, a encostar ás tábuas a orelha ruborizada de desejo, precavendo-se de se traírem pelo acelerado ritmo da respiração. E seria Revocata a vencer essa espécie de mal-entendido que prometia eternizar-se, enfiando-se sem mais reticências pelo leito adentro do mancebo, transido de um desconcerto dos sentidos que o punha violentamente a tremer. Enroscou-se nele a rapariga com uma tal instintiva sabedoria que não havia medo que se não pulverizasse, nem identidade viril que penetrantemente não imprimisse a força da sua exist4ncia. Como um animal unificado, a parodiar os que enfeitam os capitéis dos velhos templos, disparavam ambos no ímpeto de uma moção de vaivém. Procurando cada qual no corpo do outro a chave de um enigma que ignoravam em que consistiria. E entre si se abandonavam, ou seria que se iriam transmudando em mais dignos da estrela que no âmago se lhes incrustava, exaustos e recompensados, silenciando um hino de beatífica gratidão.
ClÁUDIO, Mário, Peregrinação de Barnabé das Índias, Alfragide, 3.a edição, D. Quixote, 2017, p. 57.