sexta-feira, 24 de junho de 2022

Criatura

Esplêndia criatura é a tua promessa de amor.

Não sei que lábios a pronunciaram nem que braços

se levantaram para a erguer no ar.


Mas é assim, a promessa entra pela casa

fala todas as línguas e é um homem.

Estranho que o seu rosto seja tão nítido

e no entanto não passe de um desenho

que se transformou na esplêndia criatura.


És feita de espera e não sabes pronunciar

outro verbo que não seja a conjugação 

de amar. Que ridícula é essa designação aos

olhos dos móveis tranquilos que te vigiam.

Sorriem dessa tua ânsia por que surja a criatura

esplêndia. Quando virares as costas para a porta

verás que a tua casa abafa gargalhadas

mal contidas. Não sei de nada e espero tudo

- dizes. Nenhum riso te incomoda.

Esplêndia criatura. 


 JORGE, Lídia, O Livro das tréguas, Lisboa, D. Quixote, 2019, p. 37.

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