Não chores, porque o chorar de nada serve; nem rias, porque o riso nada esconde. Sabe ignorar-te , mas não esqueças de que te ignoras. E nunca ensines a ninguém a tua consciência da vida.
Não faças o que os outros fazem, porque eles o fazem, nem o que os outros não fazem porque eles não fazem. Faze o que for mais difícil ao teu ser, sendo dele o fazê-lo. O pensamento é estéril, o sentimento inútil; só do esforço e da vontade de alguma coisa obscuramente fica.
Nem fales muito alto; nem sintas muito alto. Não penses demais, porque a compreensão da eternidade é a antecâmara da dor.
O saber da vida é a gente saber por ouvir. Mas este mal é o nosso maior bem.
Nunca fales de ti. Guarda ao teu ser o seu segredo. se o abrires nunca o poderás fechar. Não é que alguém te compreenderá, é que te descompreenderá; porque ninguém compreende os outros. Sentir-te-ás traído a ti mesmo, de uma traição desproveitosa.
Aceita a natureza como bela; mostra-te contente de ter o sol e a lua e não desagradecido das estrelas.
Sente a natureza no que ela não é. Chama-lhe mãe às vezes e serás consolado. Respira-a e sabe sentir-te abençoado por um manto de vida.
PESSOA, Fernando, O eremita da serra negra, O mendigo e outros contos, Porto, Assírio e Alvim, 2012, pp. 51-52.
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