Há já muito tempo, D' Ardelo, que queria falar-lhe de uma coisa. Do valor da insignificância. Na altura, pensava sobretudo nas suas relações com as mulheres. Queria então falar-lhe de Quaquelique. Um grande amigo meu. Não o conhece. Eu sei. Adiante. Actualmente, a insignificância surge-me de um modo completamente diverso do que então, sob uma luz mais forte, mais reveladora. A insignificância, meu amigo, é a essência da existência. Está connosco sempre e em toda a parte. Está presente mesmo onde ninguém a quer ver: nos horrores, nas lutas sangrentas, nas piores infelicidades. Exige-se-nos muitas vezes coragem para a reconhecer em condições tão dramáticas e para a chamar pelo seu nome. Mas não se trata apenas de a reconhecer, é preciso amá-la, à insignificância, é preciso aprender a amá-la. (...) Respire, D'Ardelo, meu amigo, respire esta insignificância que nos rodeia, ela é a chave da sabedoria, ela é a chave do bom humor...
KUNDERA, Milan, A festa da insignificância, Alfragide, D. Quixote, 3.ª edição, 2014, pp.148-149.
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