domingo, 2 de novembro de 2025

Correrm turvas as águas

Correm turvas as águas deste rio

Que as do céu e as do monte as enturbaram,

Os campos florescidos se secaram

Intratável se fez o vale, e o frio.


Passou o verão, passou o ardente estio,

Umas cousas por outras se trocaram,

Os fementidos Fados já deixaram

Do mundo o regimento, ou desvario.


Tem o tempo sua ordem já sabida,

O mundo, não, mas anda tão confuso,

Que parece que dele se Deus se esquece.


Casos, opiniões, natura e uso

Fazem que nos pareça desta vida

Que não há nela mais que o que parece.


Para ti Hugo, que o eterno descanso te dê a felicidade que mereces

Andrade, Eugénio, Sonetos de Luís de Camões escolhidos por Eugénio de Andrade, Lisboa, Assírio e Alvim, 2000, p. 16

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